sexta-feira, 22 de outubro de 2021

O "EFEITO BORBOLETA" NA POLÍTICA

 

O filme Efeito Borboleta (2004), do diretor e roteirista Eric Bress, é uma das produções cinematográficas mais perturbadoras dessa quadra da história, trazendo em resumo apertado - e sem spolier para quem ainda não assistiu - a seguinte mensagem: toda mudança traz consequências, no mais das vezes imprevisíveis e incontroláveis.

- Mas, o que isso tem a ver com a política?

Vamos tentar estabelecer um ponto de interseção entre ambos a partir de uma mudança nas regras do jogo eleitoral que regerá a disputa do próximo ano:  

Pra começo de conversa, as eleições gerais de 2022 já estão "bem ai", de modo que a definição das estratégias e táticas para a conquista do voto já devem estar na mesa, avançadas, para serem postas em prática. O fato é que, para definir as estratégias é preciso conhecer o contexto e construir cenários probabilísticos, levando-se em conta a peculiaridade de cada pleito.  

Para as próximas eleições, dentre algumas outras questões relevantes trazidas pela aprovação da PEC 28/21, destaco aqui a manutenção da regra aprovada na Emenda Constitucional n. 97/2017, que acabou com as coligações nas eleições proporcionais (deputados e vereadores) e que tinha sido alterada na Câmara dos Deputados. O Senado rejeitou essa proposição e manteve a regra do  fim das coligações partidárias para a disputa proporcional. Tais coligações possibilitavam a formação dos conhecidos "chapões" e "chapinhas", através das quais partidos sem qualquer identidade programática se coligavam para eleger representantes na base do quociente eleitoral. O voto dado a um candidato LGBTQIA+ do partido A, por exemplo, poderia eleger um candidato do partido B da mesma coligação, mas ligado a pautas religiosas totalmente contrárias aos interesses do eleitor que deu o seu voto ao candidato A. Do ponto de vista programático e representativo era, portanto, um desastre.

De outra banda, o modelo favorecia também aos chamados partidos-cartéis, nomenclatura dada pela Ciência Política aos partidos que garantem a sua existência por meio da adesão ao governo do momento, formando os seus quadros basicamente com a ocupação dos espaços na estrutura dos órgãos e entidades do Estado e suas ramificações. Em resumo: trata-se de partidos que não almejam o poder central e nem tem preocupação com a formação de uma base de apoio social, pois vivem da barganha por cargos públicos e benefícios do establishment - sua estratégia é eleger pequenas e médias bancadas para trocar apoio político no parlamento por privilégios na máquina pública.

Essa será a primeira eleição para deputados estaduais e federais nas quais a nova regra será aplicada, o que gera a expectativa de observação de um outro desdobramento que pode ter influência direta na formação dos palanques para as eleições majoritárias de presidente e governadores, qual seja: a necessidade de uma candidatura majoritária como ancora de voto do partido para as eleições proporcionais. Dito de outra forma: Sem as coligações proporcionais, cada partido lutará sozinho para atingir o quociente eleitoral, de modo que eleger os seus deputados sem uma candidatura majoritária que dê visibilidade ao nome e ao número do partido nas eleições gerais se torna uma tarefa muito mais complicada.

Também por esse motivo podemos ter em 22 um número elevado de candidatos à presidência da república e aos governos dos Estados, como parte da estratégia partidária de eleger as suas bancadas parlamentares e, para além de manterem as suas relevâncias no jogo político, evitarem uma fatal interdição por meio da cláusula de barreiras. 

Moral da história: o fim das coligações proporcionais tende a implicar também na formação das coligações majoritárias, considerando a necessidade das estratégias de sobrevivência de pequenos e médios partidos no parlamento. 

O "Efeito Borboleta" também vale para a política.


Fonte da imagem: capa do DVD do filme

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