segunda-feira, 22 de outubro de 2018

O QUE É O BOLSONARISMO?



A política se perfaz por meio da representação, que pode se manifestar por signos, símbolos, ideias, etc. Quanto mais elevado o cargo a que se concorre, mais isso se materializa. No caso do presidente da república, o seu perfil pessoal, os valores e práticas que defende, sua história e seus discursos respaldam determinado pensamento social: é o que o pai da sociologia, Émile Durkheim, chamaria de “consciência coletiva”. Tocando em miúdos: Se o presidente é um apoiador declarado da tortura, os torturadores se sentem subjetivamente autorizados e respaldados para torturar, se relativiza o estupro, estupradores em potencial sentem-se mais encorajados, se não tem apreço pela liberdade os autoritários se sentem fortalecidos.

Vamos ao X da questão: Quem é Bolsonaro?

- Um deputado do baixo clero eleito e reeleito majoritariamente por saudosistas da ditadura militar, homofóbicos, misóginos e racistas no Estado símbolo da violência urbana e da corrupção, sem que nunca tenha movido uma palha para lutar contra isso no seu próprio quintal. Aliás, levou a família para a política, nunca abriu mão de nenhum privilégio - é useiro e vazeiro das mais arraigadas práticas da velha política.

Porém, há algo ainda mais assustador na política brasileira atual do que Bolsonaro: é o “bolsonarismo”

O que é o "bolsonarismo?

- Forma de pensar e interpretar o mundo e a realidade com fundamento em ideias e valores respaldados pelo discurso político historicamente defendido pela família Bolsonaro e mais recentemente pelos seus apoiadores políticos mais diretos. É o agrupamento pela representação política em acessão do arcaico, retrógrado, dantesco pensamento social que estava disperso e sob o controle do processo civilizatório e limite da lei, mas que encontrou na figura do capitão falastrão um símbolo de representação social e política, saindo das escuras e se apresentando a luz do sol. O “bolsonarismo” é a janela aberta para que o ódio a liberdade, a igualdade, a fraternidade, a diversidade e ao multiculturalismo encontre respaldo político, se sinta representado e autorizado a “agir” de acordo com os seus métodos e concepções.

Não são poucos os casos que se acumulam de agressões, ameaças, constrangimentos e até assassinatos já registrados e que foram praticados por pessoas ligadas ao “bolsonarismo”, cujas motivações declaradas são racismo, misoginia, homofobia, discursos de supremacia e um outro carretel de coisas facilmente encontradas na coleção de discursos e declarações que formam a história política de Bolsonaro, dos seus filhos, dos seus assessores diretos e “homens fortes” escolhidos para um eventual governo: o seu vice fala de “auto-golpe”, seu economista de mais impostos, seu filho de prender ministro do Supremo e fechar a Corte...

Por justiça e honestidade, é preciso dizer que nem todo eleitor de Bolsonaro é soldado do "bolsonarismo". Tenho familiares, amigos, colegas de trabalho, alunos e conhecidos que votam em Bolsonaro e que estão muito longe de serem fascistas, racistas, sexistas, misóginos ou apologistas da violência. Isso é fato. Da mesma forma também é fato que há, no Brasil, pessoas e grupos que simpatizam e até defendem essas coisas, mas que, da redemocratização pra cá, nunca se sentiram representados por nenhum discurso ou candidato que, sob as suas perspectivas, respaldasse tais visões de mundo e da política - até a chagada de Bolsonaro! Portanto, afirmar genericamente que os eleitores de Bolsonaro são misóginos, racistas, sexistas, racistas, etc., não é um dado de realidade, há muitos que não são. Mas, dizer que os grupos e indivíduos que simpatizam com tais ideias, saudosistas da ditadura militar, neonazistas e supremacistas de todas as espécies estão entusiasmados e engajados na campanha do capitão e do general, é, igualmente fato e, portanto, dado de realidade.

É sempre bom reafirmar: nem todos os eleitores de Bolsonaro flertam com o fascismo, mas também não é possível negar que os que flertam com o fascismo votam em Bolsonaro.

No debate, inclusive na contestação do que se expõe nessas linhas, o bolsonarismo também se revela na estratégia argumentativa de defesa do projeto político do seu líder. Seja qual for o tema, a denúncia ou o questionamento, ele será rebatido imediatamente com os seguintes contra-argumentos:

- #B17;
- É melhor já ir se acostumando;
- Vai pra Cuba/Venezuela; e
- Aceita que dói menos.

O bolsonarismo, enfim, é um sentimento que se manifesta de diferentes formas, mas quase sempre com características excludentes e violentas. O bolsonarismo é maior e pior que Bolsonaro – ele é apenas o mantra utilizado para a manifestação das mais diversas formas de violência que vem sitiando a nossa sociedade.

Schopenhauer alertava, com um pouco mais cautela que Tiririca, que nenhuma situação está tão ruim a ponto de não puder piorar.


É melhor não pagarmos pra ver!

sábado, 20 de outubro de 2018

RECEITA PARA SE FAZER UM ESTADO DESPÓTICO E UMA SOCIEDADE OPRESSORA



PASSO A PASSO:

1. Comece atacando a liberdade, dizendo que ela é pernóstica e atenta conta a moral e os bons costumes. Para isso vingar é preciso deslegitimar e vilanizar os seus principais defensores: os intelectuais, os professores,  os artistas e os jornalistas: diga que culpa é deles e que é na arte, nas universidades e na imprensa que está o perigo;

2. Bata de cano de ferro no conhecimento científico, principalmente nas ciências sociais e humanas. Repita exaustivamente que os historiadores são farsantes e que sociólogos, antropólogos e cientistas políticos são na verdade comunistas, ateus e hereges que querem lhe enganar e levar a sua alma para a perdição;

3. Em seguida defenda fervorosamente que a fé religiosa (é claro, a sua fé, a sua religião) é mais segura é importante do que o conhecimento científico para a construção da sociedade. Afirme, peremptoriamente que precisamos de políticos que leiam e se submetam a Bíblia e não a constituição;

4. Relativize a verdade, diga que os professores são uns pervertidos e que sua vizinha já lhe mostrou uma matéria no celular dela que fala de um plano sinistro para acabar com a família tradicional por meio da liberdade que, na verdade, é libertinagem e imoralidade.

5. Agora, desmoralizados e criminalizados intelectuais, artistas, professores, jornalistas, defensores da liberdade e da democracia, diga que é chegada a hora de “botar moral” no país, que agora precisamos de um militar para acabar com as farras nas escolas, universidades, nas artes, nos movimentos sociais, na imprensa etc. Diga que precisamos de um pulso firme para defender a moral, a família e os bons costumes e que, se ele errar, ou seja, se não fizer o que a gente acha que deve ser feito, a gente tira ele depois.

6. Por fim, tudo bem batido formando uma massa pastosa, acrescente a gosto os seguintes comentários:
  • Não teve ditadura no Brasil e naquele tempo não tinha corrupção, violência e imoralidade;
  • Precisamos salvar o Brasil do comunismo;
  • Até concordo com a democracia, mas só acho que democracia de mais é anarquia e esculhambação: tem que botar moral!
  • É melhor já ir comprando passagem pra Cuba e pra Venezuela, pois num vai ter mais mamata pra negrada, viado, artista, professor pervertido, esquerdista, ateu, herege, defensor de Paulo Freire e essa corja de vagabundos das universidades. A partir de 1o de janeiro vai ser assim: Brasil, ame-o (calado e sem reclamar), ou deixe-o.

Pronto, a receita está pronta - é só colocar no forno. Se explodir o forno ou se der náuseas coletivas permanentes, a culpa foi dos intelectuais, artistas, professores, jornalistas... é só apagar a conta do Facebook e do Instagram e dizer que não teve nada a ver com isso.