segunda-feira, 20 de março de 2017

A CULPA É DA GELADEIRA? UMA ALEGORIA SOBRE NOSSA PERCEPÇÃO ACERCA DA POLÍTICA.

Claudisvanderson saiu de casa numa manhã ensolarada de domingo para ir ao supermercado fazer a feira do mês. Ao chegar, pegou o carrinho e foi direto para as mercadorias com placa de promoção, pois mesmo tendo reservado no orçamento R$: 600,00 para essas compras, se pudesse sobrar uma grana, melhor. 

Sem atentar para a qualidade dos produtos e os prazos de validade, claudsvandeeson sai escolhendo tudo pensando apenas no troco que pode ganhar naquele dia.

Ao chegar em casa, coloca todos os produtos resfriados na geladeira e os demais em um armário no fundo da cozinha. Claudisvanderson não tem o hábito de conferir a temperatura do freezer e de olhar se o interior da geladeira está limpo e em condições de acomodar a comida da família com salubridade.

Alguns dias depois todo mundo na casa começa a adoecer, ter mal estar, vômitos e tonturas. Claudisvanderson fica irritado com a geladeira, culpa a mesma por deixar os produtos se estragarem e provocar a calamidade doméstica.

Na verdade, Claudiavanderson esqueceu de lembrar que não teve nenhum cuidado na hora de escolher os produtos e, por desinteresse em ler as informações das embalagens, acabou comprando coisas para todo o mês que estavam no último dia de validade. Também esqueceu que ao não dar atenção às condições de conservação da própria geladeira, deixou de retirar dela produtos já estragados que estavam lá desde o mês passado e que contaminaram o ambiente interno.

A vantagem no dia da feira custou muito caro para todos da sua família e Claudisvanderson percebeu que a culpa não era da geladeira,  mas do seu desinteresse em cuidar da sua conservação e, principalmente, do que deixava ou colocava dentro dela.

E a política com isso?

Então, com a política é a mesma coisa, ela, assim como a geladeira, continuará existindo e sendo necessária. A grande questão é: quem colocamos para nos representar dentro do sistema político?

Se o produto não for bom, se o levarmos sem ler o rótulo (ou apenas pelo rótolo!) ou procurar saber a sua procedência, a geladeira nem resolve nem tem culpa das consequências do seu consumo. 

Se escolhermos os candidatos que iremos colocar dentro do sistema político para nos representar da mesma forma, ou seja, sem conhecer a sua história, o seu currículo, os seus compromissos, as suas competências e habilidades, o resultado será o mesmo.

A culpa não é nem da geladeira nem da política, mas dos critérios que utilizamos para escolher o que e quem colocaremos dentro delas.

Reflitamos!

segunda-feira, 13 de março de 2017

A EXPLOSÃO DA VIOLÊNCIA EM PERNAMBUCO E O URGENTE DEBATE SOBRE A SEGURANÇA PÚBLICA


Dados da própria polícia dão conta de 871 homicídios em 73 dias representa uma média de 12 assassinatos por dia, ou, ainda, uma morte violenta a cada duas horas. Se formos para os números de assalto a ônibus teremos, de acordo com sindicato dos rodoviários de Pernambuco,  808 ocorrências registradas até ontem (12/03/17), o que dá uma média inacreditável de mais de 11 por dia ou 1 a cada duas horas e vinte minutos. Na esteira desses números alarmantes, segundo o último levantamento disponibilizado em 16 de fevereiro pela SDS sobre casos de estupro, pelo menos cinco mulheres eram violentadas por dia no Estado. A situação é insustentável!

A questão da segurança pública é central na vida em sociedade. É, na base, a própria razão fundante do pacto social. Valores como liberdade, igualdade, integridade e propriedade são fortemente afetados quando a insegurança torna-se regra, tal qual sugerem os números a cima colocados.

A garantia dos direitos básicos, sobretudo educação, saúde, moradia e emprego deve ser promovida pelo Estado junto com o direito a integridade da vida, do corpo, da honra e do patrimônio, sem isso, o caos vai ganhando espaço no seio da coletividade. Políticas públicas de segurança não podem prescindir de políticas de garantia de direitos, que atuam na perspetiva da inclusão social e, portanto, da prevenção ao crime.

Da mesma forma  e paralelamente o Estado não pode deixar de dar uma resposta forte ao violador da norma, aplicando com eficácia a pena adequada ao crime cometido. Para isso precisa de polícias com capacidade investigativa (inteligência), equipes suficiente (efetivo) e instalações e equipamentos adequados (estrutura). O policiamento ostensivo e investigativo está na base da política de segurança pública, pois é através dele que o criminoso recebe a mensagem do Estado: se delinquir, será punido!

No centro, o sistema judicial precisa, tal qual as polícias de uma estrutura adequada, com promotorias, varas criminais, advogados e defensores públicos em número suficiente para atender a grande demanda da judicialização da violência, para que a lei possa ser aplicada da forma e no tempo necessário e razoável e isso, como no primeiro caso, demanda investimento.

Por fim, sem um sistema prisional minimamente adequado, a conta não fechará e o problema da criminalidade não estará sendo solucionado pelo Estado. No atual estágio dos nossos presídios não há expectativa de ressocialização e, dessa forma, de retorno harmônico e pacifico do apeando á coletividade. É ilusório acreditar que resolveremos a questão criminal sem resolvermos também a falência do sistema prisional. sem investimento isso não ocorrerá.

Como se vê, a tarefa do Estado nesse momento de tensão social e sensação generalizada de insegurança não é fácil, precisa atuar em várias frentes concomitantemente e, para isso, precisa de uma política criminal que não desconsidere os fatores multifocais da criminalidade e da inexorável transversalidade das ações estatais  e políticas públicas no combate à criminalidade.

O Pacto Pela Vida oferece essa ferramenta, é amplo e atento às várias variáveis que devem ser consideradas pela política criminal do Estado. Seus fundamentos, metodologia e transversalidade podem nos ajudar a sair desse medo constante predominante em Pernambuco. A questão não é de ausência de uma política pública adequada, mas da sua priorização, aplicação e gestão.
Ou repactuamos ou o lobo que nos habita dominará a selva urbana. Ainda tem espaço para piorar...
Isaac Luna

segunda-feira, 6 de março de 2017

ENTRE O MERCADO E A DEMOCRACIA: O TSE CONFIRMARÁ A TESE DE MARX?

No debate político brasileiro, livre graças às regras da democracia, tem surgido a tese de que, mesmo que todas as provas levem a configuração dos ilícitos eleitorais apontados na denúncia contra a chapa Dilma-Temer, o TSE deve eximir-se de cassar o mandato de Temer em nome da manutenção da "estabilidade econômica", ou da "retomada do rumo da economia".

Levado a cabo esse enunciado, o que teremos é subsunção da democracia pela economia, validando, pelo menos a priori, a tese marxista de que a economia é o vetor por excelência da vida social nas sociedades capitalistas. Os interesses econômicos preponderariam sobre os demais campos de direitos e garantias, prevalecendo sobre estes quando postos em conflito. Aplicar a lei, em determinados casos, colocaria em cheque o movimento econômico e, portanto, não seria algo desejável.

Lá na famosa introdução da Contribuição à Crítica da Economia Política (1859), diz o barbudo subversivo que nas sociedades capitalistas não é a lei que regula a atividade econômica, mas essa que regula e determina aquela, sendo “...a estrutura econômica da sociedade a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política...”(1).

Uma das mais proeminentes releitoras do marxismo da atualidade, a professora de Ciência Política na Universidade York, em Toronto, Ellen Wood, trata especificamente desse tema em um livro intitulado Democracia Contra Capitalismo (2), alertando para o movimento de supressão de direitos, liberdades e garantias democráticas provocadas contemporaneamente pela expansão do capital especulativo internacional, de um mercado que teria força natural legitimadora da sua ação.

A estabilidade da economia defendida ao custo de provocar a instabilidade democrática pode representar um risco social para o qual as consequências sejam profundamente adversas. No seu O Futuro da Democracia, Bobbio já nos alertava da inexorabilidade do respeito às regras do jogo como condição indispensável para a vitalidade da democracia. Fazer de conta que a regra não existe ou que o TSE não tem o dever constitucional de julgar o caso aplicando a regra provocaria o que convencionou-se chamar de insegurança jurídica e imprevisibilidade das expectativas de comportamento institucional. Que sociedade emergirá desse quadro é algo sobre o que temos de discutir se estamos dispostos a pagar pra ver.

O fato é que, para além de um debate teórico sobre a democracia, o que a realpolitik nos mostra é que no jogo do poder, parafraseando o poeta Accioly Neto, “ pode acontecer tudo, inclusive nada” (o não julgamento ou a não cassação), configurando mais um capítulo da surrada ideia de que, com a força avassaladora do capital, “Tudo o que era sólido se desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado” (4).


(1) MARX, Karl. Contribuição à Crítica da Economia Política. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

(2) WOOD, Ellen Meiksins. Democracia Contra Capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2003.


(3) BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia. São Paulo: Paz e Terra, 2000.

(4) MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O manifesto do Partido Comunista. Rio de Janeiro: Garamond, 1998.




sábado, 4 de março de 2017

A "PMDBZAÇÃO" DA POLÍTICA BRASILEIRA: CHANTAGEM E AMEAÇA COMO MÉTODO

Está circulando nas redes sociais um post publicado pela própria página oficial do PMDB no qual o partido vaticina em tom ameaçador: "Se a reforma da Previdência não sair: Tchau, Bolsa Família; Adeus, Fies; Sem novas estradas; Acabam os programas sociais". 

Na prática, o que o partido de Michael Temer, Eliseu Padilha, Romero Jucá e companhia está dizendo é: o que vocês preferem a miséria na joventude ou a miséria quando idosos? Preferem abrir mão de uma parte dos seus direitos de cidadania agora ou daqui há 40 anos?

Nunca é demais lembrar que pela proposta do governo a idade mínima da aposentadoria para homens e mulheres passa a ser de 65 anos, estabelecendo também o tempo mínimo de contribuição em 49 anos. 

Na prática isso significa que com 65 anos se aposentará que começou a trabalhar e contribuir para a previdência com 16 anos; se você começou apenas com 18 anos, se aposentará aos 67, se aos 21, só verá a cor da aposentadoria aos 70 anos.

A postagem assume caráter de chantagem, pois coloca a faca no pescoço do jovem universitário que depende do Fies, do trabalhador que se qualifica pelo Pronatec, da mãe que alimenta os filhos com o auxílio do Bolsa-Familia, do agricultor que depende do Pronaf, e de muitas outras pessoas que precisam dos programas de proteção social para garantirem o mínimo de dignidade.

O cenário já tinha sido traçado por Marcos Nobre, professor livre-docente de filosofia da Unicamp e pesquisador 1-B do CNPq, que ao lançar em 2013 o livro ‪"Imobilismo em movimento‬: ‪da abertura democrática ao governo Dilma", já chamava a atenção para o que chamava de "Pmdbsmo" ou Pmdbzação" da polícia. O termo não se refere necessariamente a um partido, mas uma lógica, um método de fazer política baseado em negociações de bastidores, formação de maiorias instrumentais ou pragmáticas cuja função não é defender nenhuma tese ou aprovar qualquer projeto, mas simplesmente como forma de bloquear o governo que cede as suas pressões por ocupação de espaços de poder.‬

‪Não se trata na análise dessa circunstância de ser "coxinha" ou "petralha", mas unicamente de ter capacidade crítica suficiente para perceber do que são capazes governos não eleitos pelo voto popular, e portanto não comprometidos com as causas mais elementares da população.‬
‪E você, o que pensa sobre isso?‬

Isaac Luna