sexta-feira, 14 de julho de 2017

A SENTENÇA DE LULA: UMA ANÁLISE JURÍDICO-PENAL DA CONDENAÇÃO EM 1ª INSTÂNCIA


A sentença proferida pelo juiz federal da 13ª Vara de Curitiba, Sérgio Moro, será objeto, durante muito tempo, das mais diversas análises, seja sob o viés jurídico, político ou histórico, dado todo o contexto atípico que a envolve. Nesse breve comentário nos ateremos exclusivamente a análise jurídica dos tipos penais utilizados pelo magistrado para condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, bem como a sua fundamentação para justificar a imputação dos crimes ao acusado.

Vamos, então, direto ao cerne da questão. A condenação propriamente dita com a classificação e imputação dos tipos penais correspondentes encontra-se na página 207 da sentença:

[...]
944. Condeno Luiz Inácio Lula da Silva:
a) por um crime de corrupção passiva do art. 317 do CP, com a causa de aumento na forma do §1º do mesmo artigo, pelo recebimento de vantagem indevida do Grupo OAS em decorrência do contrato do Consórcio CONEST/RNEST com a Petrobrás; e

b) por um crime de lavagem de dinheiro do art. 1º, caput, inciso V, da Lei n.º 9.613/1998, envolvendo a ocultação e dissimulação da titularidade do apartamento 164-A, triplex, e do beneficiário das reformas realizadas.
[...]

CORRUPÇÃO PASSIVA

O crime de Corrupção Passiva pode se materializar em três circunstância, quais sejam: quando o funcionário público solicita, recebe ou aceita promessa de vantagem indevida, no exercício da função ou em razão dela. Para a sua configuração jurídica, portanto, faz-se necessário a prova inequívoca da solicitação, do recebimento ou da aceitação da promessa. Não havendo isso, o fato é, como nos ensina a boa doutrina, atípico.

No caso concreto a acusação baseou-se na segunda modalidade do crime, ou seja, sustenta o magistrado que o Réu recebeu vantagem indevida, que seria o dito triplex 164-A no condomínio Solares, em Guarujá. A condenação pelo crime de corrupção passiva está vinculada, desta forma e nesse caso, a prova do recebimento do tal imóvel, demonstrando o MPF e se convencendo o julgador que o Réu é proprietário ou possuidor do bem que caracteriza a ilicitude e justifica a condenação. O magistrado alegou como fundamento e prova do fato três elementos, que passamos a analisar:

1 – Documentos de adesão a proposta de aquisição, promessas de compra e venda, notas fiscais sobre a reforma do imóvel  e documentos anotados a mão, com rasuras e sem assinatura do acusado ou de seus familiares. Tais documentos, entretanto e sob a égide da Lei Civil aplicada a espécie (art. 1.228 c/c art. 1186 do Código Civil), não configuram nenhuma das condições citadas – Propriedade ou posse:

POSSE:
Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

PROPRIEDADE:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE:
Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no registro de imóveis.

A prova da posse ou da propriedade do imóvel, portanto, deve se dar por demonstração do registro do mesmo em nome do Réu ou de um terceiro interposto seu (laranja). Pode-se também comprová-la pelo usufruto dos proveitos da coisa, ou seja, apesar de não está legalmente na posse ou na propriedade, o Réu recebe os aluguéis referentes a locação do imóvel ou indica quem deve nele se instalar a título oneroso ou gratuito. No caso concreto nenhuma dessas circunstâncias foi demonstrada ou comprovada, a qualquer título ou por qualquer modalidade, já que o apartamento não está em pose ou usufruto de Lula ou de terceiro por ele indicado.

O juiz alegou para condenação, entretanto, que haveria “posse de fato” do bem, conceito não existente no ordenamento jurídico, como bem coloca Fernando Hideo, advogado e professor da PUC-SP, ao analisar a questão (1), já que esse conceito depende da adequação do fato ao que está disposto no artigo 1.196 do Código Civil, já aqui referido, o que não foi possível se demonstrar nos autos.

2 – Depoimento de Léo Pinheiro, ex-diretor da OAS, afirmando que a entrega do triplex foi fruto de tratativa de negociação para favorecer o contrato do Consórcio CONEST/RNEST com a Petrobrás.
O depoente não juntou aos autos ou apresentou ao juiz nenhum novo documento que confirmasse o que ele alegava, de sorte que a questão da prova documental não sofreu qualquer alteração capaz de demonstrar ou corroborar formalmente com a acusação do MPF (propriedade ou posse do imóvel em comento).

Nesse particular surge uma questão intrigante e surpreendente: Léo Pinheiro fez um acordo de delação premiada em 2016, na qual inocentou Lula, porém, a mesma foi anulada em razão de ‘vazamento’ (motivo que até então não tinha sido usado para cancelar nenhuma outra delação). Em seguida foi condenado por Sérgio Moro e preso, negociando nova delação na qual acusou Lula. Essa segunda delação de Pinheiro foi o argumento mais utilizado pelo juiz na sentença como prova da entrega do imóvel a Lula. Qual o detalhe processualmente intrigante? Essa segunda delação não foi homologada e, portanto, juridicamente, não existe como tal – salvo considerando-se como valida a inovação processual da primeira delação informal do mundo jurídico (2). A prova testemunhal é, nesse caso, também inconclusiva.

3 - Matéria do Jornal O Globo, de 2010, que afirma que Lula é dono do Triplex.
Poucas considerações há de se fazer a esse tópico, salvo externar a estranheza de uma matéria de jornal comercial ser citada nove vezes na sentença com força de prova documental (3).

Contudo, a questão nos traz a possibilidade de prestar homenagem a um das maiores ícones da processualística brasileira que nos deixou no dia de ontem, a professora Ada Pellegrine Grinover que, nas suas lições imortais nos diz:  “A experiencia indica, todavia, que não é aconselhável a total liberdade na admissibilidade dos meios de prova, ora porque não se fundam em bases científicas suficientemente sólidas para justificar o seu acolhimento em juízo (como o chamado soro da verdade); ora porque dariam perigoso ensejo a manipulação ou fraudes (é o caso da prova exclusivamente testemunhal para demonstrar a existência de contrato de tal valor para cima – cfr. CPC art. 401); ora porque ofenderiam a própria dignidade de quem lhes ficasse sujeito, representando constrangimento pessoal inadmissível (é o caso da tortura, da narcoanálise, do detector de metais, dos estupefacientes etc.)” (4).

(Pela abrangência do tema, a delação ou colaboração premiada será objeto de um curso específico que estamos programando para o mês de agosto).

Os únicos documentos legalmente capazes de definição de propriedade e demonstração do negócio jurídico em exame dizem respeito ao registro do apartamento, que está em nome da OAS e hipotecado para um fundo da Caixa Econômica Federal, em razão de negócio realizados entre o banco e a construtora (5).

Dito isto, consideramos que a imputação no crime de Corrupção Passiva exige, em respeito ao princípio constitucional da não culpabilidade (art. 5º, LVII) e a determinação do ônus da prova ao acusador (art. 156, Código de Processo Penal), que esteja cabalmente demonstrado a solicitação, a aceitação ou o recebimento da vantagem pelo funcionário público em contrapartida de benefício em desacordo com a lei para o particular corruptor, e, portanto, que a prova constante nos autos é insuficiente e inconclusiva dessas circunstâncias obrigatórias para imputação e condenação no crime. Em resumo, para a condenação é preciso está provado nos autos e especificado na sentença: a) quem pagou, quanto e onde b) quem recebeu, quanto e onde c) qual a vantagem auferida por quem pagou d) qual o desvio de conduta praticado pelo agente público em benefício do corruptor.

O magistrado, entretanto, justificou o seu entendimento na página 196 da sentença, alegando que “Basta para a configuração que os pagamentos sejam realizadas em razão do cargo ainda que em troca de atos de ofício indeterminados, a serem praticados assim que as oportunidades apareçam”.
Discordamos, juridicamente, dessa interpretação e imputação.

LAVAGEM DE DINHEIRO

Diz o Art. 1o da Lei 9.613/98:

“Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012):
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)”

O crime de lavagem de dinheiro caracteriza-se pela reciclagem do dinheiro ou patrimônio de origem ilícita para torna-lo lícito. Dessa forma, o agente do crime busca dar forma de legalidade aos benefícios econômicos que auferiu como proveito de prática criminosa. Alguém que recebeu um milhão de reais de suborno, por exemplo, abre um pub e contrata bandas para lá se apresentarem sem se preocupar com o balanço financeiro da operação, pois a sua finalidade é lavar o dinheiro ilícito, ou seja, torna-lo limpo como produto do lucro aferido com os negócios regulares que fez. A configuração do tipo penal de lavagem de dinheiro exige que a finalidade da conduta praticada seja de lavagem, o que significa que a intenção do agente deve ser a de integrar o patrimônio ilícito à economia com aparência lícita (6)

No caso em comento, o ex-presidente Lula foi condenado pelo crime de Lavagem de Dinheiro em razão da ocultação do patrimônio do triplex, imóvel pelo qual foi condenado no crime de Corrupção Passiva em razão do seu recebimento em troca de favorecimentos a OAS. A tese é a de que a inexistência de qualquer registro de posse ou propriedade do imóvel em nome de Lula seria deliberada, para garantir a ocultação, caracterizando a lavagem.
Ocorre que, se o bem produto da ilegalidade não será lavado para ser reinserido no mercado e no patrimônio do beneficiário com aparência de licitude, ou seja, limpo, não está configurada a operação de lavagem, que desenvolve-se em três etapas:

Colocação do dinheiro no sistema econômico, em atividades de mercado e circulação de dinheiro em espécie, para torna-lo limpo;

Ocultação, fase na qual o criminoso procura dificultar o rastreamento contábil dos recursos ilícitos,  com a finalidade de quebrar a cadeia de evidências ante a possibilidade da realização de investigações sobre a origem do dinheiro;

Integração, momento no qual os ativos são incorporados formalmente ao sistema econômico (7).

Se o patrimônio não poderia ser legalizado e integrado ao patrimônio do agente com verniz de licitude, não há, portanto, a observância do inter criminis do tipo penal em analise e, portanto, não há de se falar na sua configuração. É nesse sentido que se manifesta também o professor Afrânio da Silva Jardim, professor da UERJ e uma das maiores autoridades em Processo Penal do País: "Lula foi condenado por receber o que não recebeu e por lavagem de dinheiro que não lhe foi dado ... Vale dizer, não teve o seu patrimônio acrescido sequer de um centavo !!! Não recebeu nenhum benefício patrimonial e por isso não tinha mesmo o que 'lavar'..." (8).

Outro ponto de relevância jurídico-penal a ser analisado é a questão do concurso de crimes. O magistrado na sua decisão considerou que o crime de Corrupção Passiva (recebimento do triplex) e o crime de Lavagem de Dinheiro (ocultação do triplex), constituem duas condutas distintas, ferindo dois bens jurídicos distintos e, portanto, devendo serem considerados na regra do art. 69 do Código Penal (Concurso Material de Crimes), hipótese em que as penas serão somadas.

Impossível não trazer a baila o art. 70 do mesmo CP, que trata do chamado Concurso Formal de Crimes, por meio do qual as penas não devem ser somadas, havendo apenas a majoração da mais grave delas. Em síntese: a) no concurso material o agente com duas ou mais ações pratica dois ou mais crimes; b) no concurso formal, agente com uma só ação pratica dos ou mais crimes.

Caso a condenação pelos crimes permaneça, máxime o de lavagem de dinheiro (considerando que não houve operação de lavagem do imóvel), a interpretação mais correta deve ser pela aplicação da regra do concurso formal, já que ambas as condenações são fundamentadas no mesmo fato – circunstância conhecida no Direito Penal Democrático como bis in idem, nefasta figura que permite a dupla condenação pelo mesmo fato, acertadamente já expurgada do nosso ordenamento (vigora entre nós o princípio do ne bis in idem).

A opinião de um dos mais respeitados doutrinadores penais do Brasil, o professor Guilherme de Souza Nucci, é ainda mais contundente, levando o caso concreto a absolvição da lavagem pela corrupção: “Se houver um único ato de recebimento de dinheiro indevido, por exemplo, por um funcionário público, embora se possa sustentar que, pelas condições, ocorre uma lavagem de dinheiro, antes disso, está-se focando a corrupção.  Pouco importa de onde o dinheiro veio e para onde ele vai, o fato é que está caracterizada a corrupção, que absolve a lavagem de dinheiro” (9).

O fato é que, sem a comprovação do recebimento do imóvel objeto das duas condenações, ambas devem ser descaracterizadas. Considerando que haja a prova documental da posse do bem, restará configurada a Corrupção e afastada a Ocultação – e portanto a Lavagem de Dinheiro. Mantida a condenação também pela ocultação, deverão os crimes serem havidos em Concurso Formal, afastando-se a soma das penas preconizada pelo Concurso Material.

Diante de todo o exposto, a única maneira de argumentar e fundamentar a sua decisão era indo buscar em ordenamentos alienígenas os institutos que usaria. Assim, o magistrado justifica o seu entendimento com base na figura do standart de prova, conceito sem aderência no direito pátrio e de forte inspiração no direito anglo-saxão. O tema é deveras extenso para aprofundarmos nessa oportunidade, mas vale a pena conferir o artigo de Salah Khaled Jr e Alexandre Moraes da Rosa sobre o tema, ficando aqui apenas uma passagem que tem ligação direta com a argumentação  por nós sustentada: “O standard probatório sustentado por Moro e “referendado” pela jurisprudência indicada é fruto de suas próprias predileções político-criminais. E pensamos que elas remetem a matrizes inquisitórias de processo penal, que admitem flexibilização da exigência probatória necessária para derrubar a presunção de inocência. A ideia de que a prova indiciária ou indireta (ou elementos circunstanciais, como indicado na jurisprudência) pode satisfazer ao standard de prova exigido pelo processo penal de corte acusatório e democrático nos causa arrepios. Também não admitimos que a presunção de culpabilidade torne-se um critério aceitável para o processo penal e isso é mais do que visível na jurisprudência americana e espanhola. Trata-se de uma inversão completa do sentido que deve demarcar o horizonte probatório do ritual processual penal. Nesse sentido, Moro de fato está correto. A assunção dessas premissas não enfraquece as garantias do acusado: simplesmente as destrói irremediavelmente” sublinhado no original (10).

Eis a manifestação de alguns dos grandes juristas brasileiros sobre a sentença:

SALAH H. KHALED JR, doutor e mestre em Ciências Criminais: “o investimento foi grande demais. Não interessa que a propriedade do tríplex soe como mera conjectura. A montanha não poderia parir um rato. Condenando Lula, Moro assegura que sua reputação permanecerá intacta. Se o resultado for revertido em segunda instância, em nada o afetará. Pelo contrário: pode fazer com que sua imagem de salvador da pátria saia ainda mais fortalecida” (10)

PEDRO SERRANO, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)  “Vemos um processo penal de exceção com finalidade política, que tende a esvaziar de sentido a Constituição Federal e agredir de frente os direitos humanos. Tem um efeito contra Lula e contra a sociedade, pois os direitos de todos estão ameaçados. Não se trata do PT ou da esquerda. Não se trata da Lava Jato. Há uma jurisprudência de exceção sendo feita no Brasil” (11)

WALBER AGRA, doutor em Direito e professor da UFPE: “Não estou dizendo que Lula é inocente. Estou dizendo que nos autos não há provas que possam incriminá-lo. [...] Ele (Moro) afirma que o ex-presidente é chefe de quadrilha sem mostrar os fatos; incrimina em corrupção passiva sem dizer de onde veio o dinheiro; condena por lavagem de dinheiro sem provar a corrupção passiva...” (12)

NÉLIO MACHADO, um dos mais respeitados advogados criminalista do Brasil: “O rigor da pena aplicada fala por si, atingindo mais de 9 anos, em regime fechado, exacerbação incompatível, provadas estivessem as imputações, com o princípio da proporcionalidade, instituído em 1764 por Cesare Beccaria, no insuperável Dos Delitos e Das Penas” (13)

AFRÂNIO SILVA JARDIM, doutror em Direito e professor de Processo `Penal da UERJ: "Como caracterizar lavagem de dinheiro sem dinheiro? O réu Lula não recebeu 'propina' e com ela comprou o imóvel, colocando-o, dissimuladamente, em nome de terceiro. No caso, o imóvel é da OAS e continua em nome da OAS. Note-se que a OAS terá até embargos de terceiros, diante do confisco determinado pela sentença" (14)


Da decisão, por fim, cabem Embargos de Declaração e Apelação. A defesa deve alegar senão todos, pelo menos parte das questões aqui levantadas.

A bola está com o TRF da 4ª Região, aguardemos!

Isaac Luna – Mestre em Direito pela UFPE, especialista em Ciência Política pela UNICAP, professor de Criminologia da pós-graduação e de Direto Penal da UniFG.


REFERÊNCIAS:

(1) PROFESSOR DA PUC DESMONTA ARGUMENTOS DE MORO PARA CONDENAR LULA. (Portal Pragmatismo Político). Disponível em: https://www.pragmatismopolitico.com.br/2017/07/professor-puc-desmonta-moro-condenar-lula.html. Acesso em: 13/07/2017.

(2) MUITA CONVICÇÃO, NENHUMA PROVA. O RAIO-X DA SENTENÇA DE MORO NO CASO TRIPLEX (Portal Justificando). Disponível em: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/07/13/muita-conviccao-nenhuma-prova-o-raio-x-da-sentenca-de-moro-no-caso-triplex/. Acesso em: 13/07/2017.

(3) PROFESSOR DA PUC DESMONTA ARGUMENTOS DE MORO PARA CONDENAR LULA. (Portal Pragmatismo Político). Disponível em: https://www.pragmatismopolitico.com.br/2017/07/professor-puc-desmonta-moro-condenar-lula.html. Acesso em: 13/07/2017.

(4) CINTRA, Antonio Carlos de Araujo; GRINOVER, Ada Pellegrine; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 16. Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000. p. 348).

(5) MUITA CONVICÇÃO, NENHUMA PROVA. O RAIO-X DA SENTENÇA DE MORO NO CASO TRIPLEX (Portal Justificando). Disponível em: http://justificando.cartacapital.com.br/2017/07/13/muita-conviccao-nenhuma-prova-o-raio-x-da-sentenca-de-moro-no-caso-triplex/. Acesso em: 13/07/2017.

(6) PONTES, Felipe Gabriel. O crime de lavagem de dinheiro na sentença de Lula. (Canal Ciências Criminais). Disponível em: https://canalcienciascriminais.com.br/lavagem-dinheiro-sentenca-lula/. Acesso em: 13/07/17.

(7) COAF – CONSELHO DE CONTROLE DAS ATIVIDADES FINANCEIRAS. Fases da Lavagem de Dinheiro. DOSPONÍVEL EM: http://www.coaf.fazenda.gov.br/links-externos/fases-da-lavagem-de-dinheiro. Acesso em: 13/07/17.

(9) NUCCI, Guilherme de Suoza. Corrupção e Anticorrupção. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 69.

(10) KHALED JR, Salah; ROSA, Alexandre Morais da. O standard de prova de Moro e o enfraquecimento das garantias do acusado: uma provocação. (Portal Empório do Direito). Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-standard-de-prova-de-moro-e-o-enfraquecimento-das-garantias-do-acusado-uma-provocacao-por-salah-khaled-jr-e-alexandre-morais-da-rosa/. Acesso em: 14/07/2017.

(11) COMUNIDADE JURÍDICA CRITICA CONDENAÇÃO DE LULA POR SÉRGIO MORO. (Portal Justificando). Disponível em:  http://justificando.cartacapital.com.br/2017/07/12/comunidade-juridica-critica-condenacao-de-lula-por-sergio-moro/. Acesso em: 13/07/2017.

(12) SERRANO, Pedro. Para o jurista Pedro Serrano atravessamos um momento aproximado do nazifascismo. (Portal da Revista Fórum). Disponível em: http://www.revistaforum.com.br/2017/07/13/para-o-jurista-pedro-serrano-atravessamos-um-momento-aproximado-nazifascismo/. Acesso em: 13/07/2017.

(13) SENTENÇA DE MORO CONTRA EX-PRESIDENTE DIVIDE JURISTAS (Portal JC). Disponível em: http://m.jc.ne10.uol.com.br/canal/politica/nacional/noticia/2017/07/12/sentenca-de-moro-contra-ex-presidente-divide-juristas-295113.php. Acesso em: 13/07/2017.

(14) NELIO MACHADO, UM DOS MAIORES CRIMINALISTAS DO PAÍS, DETONA SENTENÇA DE MORO (Portal O Cafezinho). Disponível em:  http://www.ocafezinho.com/2017/07/13/nelio-machado-um-dos-maiores-criminalistas-do-pais-detona-sentenca-de-moro/. Acesso em: 13/07/2017.

(15) LULA É CONDENADO POR LAVAGEM DE DINHEIRO QUE NÃO LHE FOI DADO, DIZ JURISTA. (Rede Brasil Atual). Disponível em:  http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2017/07/lula-foi-condenado-por-receber-o-que-nao-recebeu-e-por-lavagem-de-dinheiro-que-nao-lhe-foi-dado. Acesso em: 14/07/2017.


sexta-feira, 7 de julho de 2017

SOB PRESSÃO: VIOLÊNCIA NA RMR SE EXPANDE DAS MARGENS PARA O CENTRO E ROMPE O "LIMITE DA TOLERÂNCIA".

A criminalidade violenta tende a ser um problema maior quanto mais ela atinge setores da sociedade que tem poder de pressão sobre os governos, ou seja, quando passa a ser um problema palpável também para os incluídos.

As mortes violentas em Pernambuco, no que pese o absurdo dos números, atingem em regra e historicamente pessoas de extratos sociais menos abastados, não detentoras dessa capacidade comunicativa de denúncia, cobrança e articulação social, muitas vezes por ausência de acesso aos meios de comunicação social de massa e as instituições oficiais do Estado. A pressão sobre o governo, portanto, ocorre em níveis suportáveis e controláveis.

Se a violência percebida no Estado ocorresse de forma menos concentrada e atingisse em números regulares espaços geográficos e grupos socioeconômicos mais próximos a classe média nos bairros mais tradicionais e urbanizados, já estaríamos vivenciando um estágio de convulsão social agudo com os números existentes.

Quando decidi escrever esse post lembrei imediatamente de um trecho da introdução de um pequeno grandioso livro do professor Luciano Oliveira, de quem fui orientando no mestrado, intitulado Do Nunca Mais ao Eterno retorno: Uma Reflexão Sobre a Tortura (1), no qual o autor traz ao debate o Capitão Segura, figura dos tempos ditatoriais da Cuba de Fulgencio Batista, que dizia estarem equivocados os que pensavam que a sociedade era dividida entre opressores e oprimidos, sendo a verdadeira divisão aquela que ocorre entre duas classes: “a dos torturáveis e dos não torturáveis”.  Algo parecido, nos termos do jus-filósofo italiano Giorgio Agamben, com o "homo sacer", figura do direito Penal arcaico do império romano que definia aquele que podia ser morto por qualquer um sem consequência jurídica (2).

Seguindo o mote inicial, temos que quando a criminalidade mais crua começa a atingir o grupo social historicamente menos vulnerável a sua manifestação violenta direta, principalmente com homicídios, latrocínios, roubo com uso de arma de fogo, estupros etc., a tendência é que a sensação de insegurança e a intolerância a episódios corriqueiros passem a ser acentuados. Não é necessariamente o aumento das taxas de criminalidade, violência, crueldade, banalidade ou torpeza que a caracteriza, mas fundamentalmente uma mudança no perfil da vítima. Dito de outra forma: quanto mais a criminalidade violenta se movimenta das margens para o centro, das encostas para o asfalto ou da comunidade para o bairro, maior será a pressão social sobre os governos para uma atuação mais efetiva e resolutiva sob a questão.

Essa diferença entre sensação de insegurança e probabilidade real de ser vítima de um evento violento é extraordinariamente bem tratada e demonstrada numa obra monumental de Danel Míguez e Alejandro Isla, doutores em Sociologia e Antropologia, respectivamente, intitulada Entre La Inseguridad e el Temor Instatáneas de la Sociedad Actual (3). Para os professores da Universidade Nacional de Buenos Aires, vários fatores, para além da ocorrência do crime em si, concorrem para que se propague a sensação de insegurança no seio social, dentre eles a atuação da mídia na forma e na frequência da divulgação das ocorrências, bem como a confiança da população no sistema de justiça criminal do Estado capaz de fazer frente a investida da criminalidade, notadamente as corporações policiais, a atuação do Poder Judiciário e as agências e instituições estatais encarregadas de promover políticas públicas de prevenção e controle da criminalidade. Nas palavras dos autores: “Aquilo que faz com que uma pessoa esteja exposta a ser vítima de um delito não coincide exatamente com o que faz que tenha temor de enfrentar essa situação. Ou seja, a probabilidade real de alguém ser vítima não determina por si mesma a intensidade da sensação de que a qualquer momento poderá sê-lo” (p. 14 – tradução livre).

Nesse sentido, percebemos que nos últimos dias Pernambuco vem vivendo episódios de violência explícita que colocam na cena do crime, na condição de vítimas, estudantes (4) e professores universitários (5), profissionais liberais (6),  comerciantes, religiosos (7), enfim, um grupo não convencional de vítimas de crimes violentos,  em ações que ocorrem em área mais urbanizadas das cidades, em tese mais seguras.

Nesse contexto, ainda que o governo do estado apresente números com eventual diminuição de indicadores específicos, principalmente de CVLI's (Crimes Violentos Letais Intencionais), a sensação de insegurança dificilmente será arrefecida, pois estará sendo propagada por setores sociais com muito mais potencial de publicizá-la, seja nas redes sociais, na mídia tradicional ou nos ambientes institucionalizados da sociedade com maior capacidade de influenciar a opinião pública.

Se o exposto tem coerência fática, segue-se a seguinte hipótese: ainda que os números caiam, a pressão sobre o Governo e a sua política de segurança pública tendem a, inversamente, subir.

Vamos observar e aguardar os acontecimentos dos próximos dias.

Isaac Luna

REFERÊNCIAS CITADAS NO TEXTO

(1) OLIVEIRA, Luciano. Do Nunca Mais ao Eterno retorno: Uma Reflexão Sobre a Tortura. São Paulo: Brasiliense, 1994 (Coleção Tudo é História, n. 149)

(2) AGAMBEN, Giorgio. Homo Sacer – O poder soberano e a vida nua I. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2010

(3) MÍGUEZ, Danel; ISLA, Alejandro. Entre La Inseguridad e el Temor Instatáneas de la Sociedad Actual. Buenos Aires: Paidós, 2010 (Temas Sociales n. 63)





domingo, 2 de julho de 2017

A SOCIEDADE E SEUS MITOS: BOLSONARO COMO PRODUTO DA CULTURA GERAL DOS NOSSOS DIAS

O ponto de partida do presente post é o seguinte: a Política é um dos produtos da vida social derivado da cultura geral dos povos.
Para ficar mais clara a linha de raciocínio, importante esclarecer que o termo cultura é considerado aqui no seu conceito antropológico, como bem já expôs o professor Roque de Barros Laraia (Cultura: Um Conceito Antropológico, Zahar Editor, 2011), ou seja, como um “saber fazer histórico” característico de cada povo nas suas diferentes formas de organização social, para lembrar o debate proposto pelo grande antropólogo José Luiz do Santos (O Que É Cultura, Editora Brasiliense, 19996).

A política, portanto, é reflexo da capacidade de compreensão do mundo ao redor e dos valores predominantes na sociedade, frutos, em grande medida, do nível de educação, formação e erudição presentes no seio social. Ideias como cidadania, liberdade, humanismo, tolerância estão diretamente relacionados ao tipo e a qualidade do conhecimento produzido e disseminado coletivamente.

Nesse sentido, vivemos tempos de desprezo pelo conhecimento, o que é facilmente percebido pelas baixíssimas taxas de leitura, afrouxamento avaliativo na formação, monumental desconhecimento da história, ojeriza à Filosofia, à Sociologia ou a qualquer outro campo crítico do pensamento humano. Estaríamos na era  do Culto ao Amador, como bem alerta Andrew Keen (Zahar Editor, 2007) e da absoluta irresponsabilidade com o cuidado de checar as fontes das informações lidas, compartilhadas e defendidas como expressão acabada e inquestionável da verdade, levando ao que a Universidade de Oxford denominou de tempo da “Pós-Verdade” (não importam os fatos objetivos, mas sim aquilo que confirma o que se acredita ou se deseja previamente, os ditos pré-conceitos. A verdade é secundária!).

Na outra ponta da sinuca está a questão valorativa, os preceitos morais, o senso ético de comunidade, cidadania e humanidade observado em dada sociedade. Uma rápida olhada no face book mostra que atravessamos um momento que sugere forte influência de valores que negam os ideais que construíram o que ficou conhecido como idade da razão, era das luzes e humanismo. Nesse mesmo sentido, ainda no final do século XIX o filósofo alemão Friedrich Nietzsche já havia alertado que o conjunto valorativo intitulado de “Ética Cristã” não passava de um discurso apartado das reais práticas cotidianas do homem ocidental (O Anticristo, Martin Claret, 2005). Para ele, o conceito de cristão deveria ser atribuído àquele que, no caso concreto da vida real age tal qual o Cristo agiria se estivesse no seu lugar, o que não acontecendo mostraria, segundo ele, a hipocrisia do dito cristão que não orienta a sua vida pelos valores defendidos por aquele que ele diz seguir – o Cristo.

O desejo de extermínio do outro como solução, o desprezo e a espetacularização do sofrimento humano, o ataque a liberdade e o ódio a homossexuais, negros, nordestinos ou qualquer pessoa que tenha uma compreensão de mundo diversa é prática recorrente, aplaudida e compartilhada por jovens atônitos em um mundo de difícil compreensão, pequenos burgueses ciosos por se tornarem grandes burgueses, moralistas de todos os tipos e gente que, mesmo de boa-fé, acredita em supressão de direitos, violência e autoritarismo como soluções para os problemas sociais.

POIS BEM: A EXISTÊNCIA DE SEGUIDORES E DEFENSORES DE BOLSONARO É PRODUTO DESSA REALIDADE CULTURAL QUE CARACTERIZA A CENA BRASILEIRA ATUAL.

Chega a ser impressionante ver mesmo gente com diploma de nível superior fazendo comparações anacrônicas e absolutamente despropositadas, falando de inimigos perigosos como o comunismo e Venezuela, etc. A radicalização do discurso é resultado do desejo de poder ou de servir ao poder aliado ao desconhecimento da história, da sociedade e da política.

Figuras messiânicas, autoritárias e vazias de conteúdo – que sempre existiram – surgem nesses contextos: o “Bolsomito” não é diferente, é apenas mais um candidato a ditador que encontra eco em parte dessa sociedade que temos hoje em terras brasileiras.

Será eleito? Muito difícil, apesar de não ser impossível. Lembro de um livro que li há uns 20 anos, do então professor Cristovam Buarque, intitulado A Eleição do Ditador, mostrando que a manipulação das massas pode levar a qualquer resultado eleitoral, até ao mais absurdo (Editora Paz e Terra, 1988).

Contudo, numa campanha pra valer a ausência de propostas e de conteúdo ficará exposta, as meras bravatas e frases de efeito terão dificuldade em convencer a maioria da população sobre questões relevantes no dia a dia das pessoas, tais como políticas públicas para educação, saúde, assistência social, juventude, cultura, mulher, diversidade, questões étnico-raciais, geração de emprego e renda, salário mínimo, etc. O que você conhece de propostas do “mito” sobre essas questões? E sobre política econômica, relações exteriores, pacto federativo? Provavelmente nada!

Aguardemos 2018!
Isaac Luna