terça-feira, 10 de janeiro de 2017

"SÓ MORRERAM 89? ERA PRA TER MATADO MAIS!"



Uma das características mais intrigantes que envolvem o extermínio de presos nas penitenciárias de Manaus e Roraima é o volumoso apoio popular a carnificina. Falas e pronunciamentos de alguns agentes e "autoridades" públicas vão contribuindo para dar um tom de normalidade aos acontecimentos.

É claro que em uma democracia os indivíduos são livres para manifestarem as suas opiniões, não é disso que se trata. A questão que chama a atenção é especialmente definida pela defesa de ideias contraditórias e valores incompatíveis, fato que em um sistema lógico de raciocínio é classificado como incoerência.

São apenas dois os pontos tratados nessa breve reflexão, sendo um de caráter político-jurídico e outro de natureza ético-moral. Então vamos lá:

Em regra, as pessoas tendem a identificar o descumprimento da Constituição Federal como uma das causas da desordem social e do entrave ao progresso, valores máximos estampados no centro da nossa bandeira nacional (ordem e progresso). Portanto, é possível supor com um razoável juízo de probabilidade que as pessoas, em geral, desejam e defendem que a Constituição seja cumprida. Dito isso, e sendo certo também que a nossa Carta Magna consagra como direitos fundamentais a garantia da vida e a proibição de penas de morte, cruéis e degradantes, seria lógico e racional concluir que, aqueles que desejam e defendem o cumprimento da Constituição, desejam e defendem por consequência o cumprimento dos direitos e garantias que nela estão assegurados, como os exemplificados a pouco.

No outro lado dessa mesma moeda temos uma sociedade que declara-se majoritariamente seguidora dos ensinamentos de Jesus Cristo. Igrejas que professam obediência ao evangelho se multiplicam pelo país com um número cada vez maior de seguidores, elegendo, inclusive, inúmeros deputados, senadores e prefeitos nos quatro cantos do país. O código valorativo que rege essa multidão de indivíduos seguidores do cristianismo é o que se chama de ética cristã, campo moral que tem como pilares, dentre outros, os ensinamentos de amar ao próximo como a si mesmo,  não matar, não julgar e acreditar que somente o d'us* tem poder de decidir sobre a vida e a morte.

Não é demais repetir: o sistema democrático garante a liberdade como regra, inclusive de opinião, de ideologia e de consciência.

O que motiva o debate nessas poucas linhas, então, é exclusivamente a questão de observar se há coerência social e moral entre o que se diz defender e acreditar, e o que, na prática, se defende e se apoia nos casos práticos da vida real.

Um grande poeta da nossa geração dizia: "ninguém respeita à Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação...". Talvez seja hora de observarmos bem os valores predominantes em nossa sociedade para refletirmos se somos de fato aquilo que pensamos ou dizemos ser, afinal, como diz um dos ensinamentos que parece acreditarmos: tudo nos é permitido, mas nem tudo nos convém!
Isaac Luna


* A Palavra d’us foi grafada sem letra maiúscula e com o apostrofo (marcando a supressão da letra ‘e’)  para não incorrer na possível  incoerência de usar o santo nome em vão, conforme o terceiro dos dez mandamentos recebidos por Moisés.

URL da imagem: http://www.reporter-am.com.br/wp-content/uploads/2015/02/Presos-mortos-rr.jpg

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