sábado, 21 de janeiro de 2017

PELOS ARES: O RISCO DE VOAR ALTO NA POLÍTICA BRASILEIRA

Acidentes aéreos acontecem, isso é um fato. Políticos e empresários, como pessoas com volume de deslocamento acima da média são pessoas que estão expostas a essa realidade e podem morrer em quedas de aeronaves, também é fato.

Ocorre que, por algum fenômeno que a ciência aeronáutica não desvendou ainda e para o qual os futurólogos ou a roda da sorte, ou do destino, ou da fortuna (como diria Maquiavel), não tem explicação, no espaço aéreo brasileiro essa probidade aumenta em proporções gigantesca em relação a qualquer outro lugar planeta terra.

Então vamos lá:

Em 18 de julho de 1967 o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco sai do sítio da amiga e escritora Rachel de Queiroz na cidade de Quixadá com destino a Fortaleza em um avião cedido pelo governo do Estado do Ceará. Trinta minutos depois um jato da FAB bate a asa (do lado em que o tanque de combustível estava seco) no avião do ex-presidente que cai e provoca a sua morte (o jato da FAB não sofreu maiores avarias). Os laudos indicaram que se tratava de um acidente e o caso foi encerrado.

OBS: Não vamos tratar da morte de JK (22 de agosto de 1976), que foi em um “triste e fatídico acidente rodoviário”, nem da de Tancredo (21 de abril de 1985), que além de não ter sido no ar, foi por “causar naturais”.

O então ministro da Reforma Agrária, uma das questões de maior conflito na Assembleia Nacional Constituinte envolvendo movimentos sociais e latifundiários, o pernambucano Marcos Freire, findou-se em 8 de setembro de 1987 na misteriosíssima explosão do avião em que estava em viajem oficial no sul do Pará, uma das áreas de maior conflito no campo fundiário no Brasil até hoje. Freire era favorável a reforma agrária mais ampla e estrutural.

Na noite de 12 de outubro de 1992 o “homem da Constituição Cidadã” e um dos principais articuladores do impeachment do ex-presidente Fernando Collor,  o Deputado Ulysses Guimarães, morreu na queda do seu helicóptero particular em Angra dos Reis. Não há registro de comunicação da aeronave com nenhuma torre, nem dos tripulantes com familiares ou amigos. O corpo do “Dr. Ulysses” nunca foi encontrado.

No dia 13 de agosto de 2014 o ex-governador de Pernambuco e forte concorrente ao Palácio do Planalto naquele ano, Eduardo Campos, morre na impressionante queda do avião particular em que estava, em plena área residencial de Santos-SP. Viajando em uma aeronave considerada excelente por especialistas, com um piloto experiente no comando, Campos saiu de cena em meio a depoimentos de testemunhas falando em bola de fogo, denúncias de corrupção, incertezas sobre a propriedade e origem dos recursos que financiavam o avião e uma candidatura que era considerada promissora por diversos analistas políticos, contado para, no mínimo, está no segundo turno daquelas eleições.

Em 11 de novembro de 2015 um “acidente” com jato particular de fabricação americana com todas as licenças em dia e voando em tempo aberto e condições favoráveis, mata o presidente da Bradesco Seguros, Marco Antônio Rossi, e o presidente da Bradesco Vida e Previdência, Lucio Flávio Conduru de Oliveira, ambos fortíssimos candidatos a assumirem a presidência do banco. A queda do avião ocorre em meio a denuncias e investigações envolvendo o Bradesco em escândalos de corrupção e lavagem de dinheiro. Oito meses após o ocorrido a Justiça Federal em Brasília aceitou denúncia contra o diretor-presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, e mais nove pessoas na Operação Zelotes.

O presidente da mineradora Vale durante 10 anos, Roger Agnelli, despediu-se dessa existência em 19 de março de 2016, quatro dias depois de enviar uma carta a então presidente Dilma Rousseff denunciando desvios na empresa. O avião particular no qual estavam Agnelli e sua família decolou do Campo de Marte em direção ao aeroporto Santos Dumont e, instantes depois se chocou com uma casa a cerca de 200 metros da cabeceira 12 do aeroporto, explodindo e matando todos.

Após instituir uma força-tarefa durante o recesso e de antecipar a volta das férias para homologar as delações da lava-jato e quebrar o sigilo de mais de 900 depoimentos, o ministro relator operação no STF, Teori Zavascki, morre em um acidente com avião particular que cai no mar de Paraty. No dia seguinte o ministro chefe da casa civil da presidência da república diz que com a morte do ministro o governo “ganhou tempo” e Jornal da Globo News diz que o mercado amanheceu mais confiante (em razão da morte).

O post, esclareça-se, é meramente retrospectivo, sem condão de denúncia. Mas, inegavelmente, o seu conteúdo tem caráter provocativo, busca atiçar o pensamento e a reflexão mais cuidadosa sobre o peculiar fenômeno brasileiro da seletividade cirúrgica dos passamentos em razão de “acidentes aéreos”. 

Registre-se, por fim: em nenhum dos casos descritos no post há réus – a não ser o mau tempo, a fatalidade e o destino.

É prudente, nesse caso, pensar bem antes de buscar voos mais altos na política em terras, ou melhor, em ares brasileiros...

Isaac Luna 

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