quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

O BALAIO DE TUBARÕES DA POLÍTICA BRASILEIRA: É POSSÍVEL VIRÁ-LO? (Re-postágem)

A delação da odebrechet, que implica um número razoável de políticos dos mais variados partidos, cria o campo adequado para o que poderíamos chamar, em uma análise política com tempero nordestino, de teoria do balaio. O que é isso, como funciona esse raciocínio?

Antes é preciso confessar que uma parte da inspiração desse post vem de um fantástico e conhecido texto de Bertolt Brecht intitulado "Se os Tubarões Fossem Homens?", uma alegoria sobre o  poder ocorrida no fundo do mar (1).

Então vamos lá:

Quanto mais cheio o balaio e, principalmente, quanto mais cheio com peixes graúdos, mais pesados (os ditos "tubarões"), mais difícil torna-se de virá-lo.

- Por que?

A improvável tarefa de virar o balaio sem derrubar todos os peixes, ou a sua maioria, ou os maiores, faz com que se busque alternativas de não virá-lo, criando um campo de proteção que deixe espaço apenas para cair alguns peixes que estão pelas beiradas e podem cair sem que o balaio precise ser virado. A estratégia é permitir apenas algumas sacudidas no balaio para que caiam peixes de menor porte ou, mesmo alguns de grande porte mas já sem força nas nadadeiras ou trânsito livre com os tubarões-chefes, aqueles que estão nos postos de comando. Com isso se  evita ou minimiza a níveis controláveis a crítica de que "não deu em nada", que a Justiça não pune os poderosos, que “tá tudo dominado!”, etc.

Algumas cabeças precisam rolar para que tudo acabe bem, ou, como diria Tomasi di Lampedusa em uma das grandes obras da literatura universal, intitulada O Leopardo: "Algo deve mudar para que tudo continue como está" (2).

Tenciona-se, em razão disso, a que Peixes que nadam em águas diferentes, que são a princípio adversários, busquem um acordo para que o balaio seja mantido de pé.

Aqui reside a tese: Quanto mais peixe graúdo dentro do balaio, mas difícil de vira-lo. Quanto mais gente influente, de um número maior de partidos e do mundo empresarial estiverem envolvidos nas denúncias e delações, mas difícil que elas prosperem a ponto de virar a mesa do poder.

Hoje o xadrez da virada do balaio passa por uma questão, ou mais especificamente, por um peixe bem determinado. Dito de forma direta: é possível que o Lula caía do balaio sem que isso implique a queda de outros grandes personagens? Ou: não virar o balaio implica também em não derrubar o Lula?

Os mais graúdos tubarões da política brasileira estão no balaio, ou prestes a entrar nele com a possível (ou não) homologação do último lote de delações da lava-jato, criando um peso enorme, que exigirá muita força para colocá-lo de ponta-cabeça.

Se ainda for possível considerar como válida a tese apresentada pelo cientista político Guilhermo O’Donnell como resultado de uma análise que já tem três décadas (3), ou seja: a de que o Brasil é um país cômodo para os políticos em razão da contunde ausência de uma sociedade civil politicamente organizada que possa fazer pressão contrária aos interesses endógenos dos "Donos do Poder" (pra não esquecer Faoro), o balaio, ou a mesa na qual está o banquete do poder, tente a não virar.

Os movimentos das próximas semanas serão cruciais para essa definição. É aguardar com atenção para ver para onde correrão as aguas, sem perder de vista, nunca, o que nos diz o escritor e poeta russo Maiakóvski: “O mar da história é agitado...” (4).


(1)   LAMPEDUSA, Giuseppe Tomasi di. O LEOPARDO. Editora Dom Quixote: Lisboa, 2014.

(2)  BRECHT, Bertolt. Se os tubarões fossem homens. In:  Histórias do Sr.  Keuner.  Madri.  Alianza  Editorial.  p.  27-29.


(3)  O’DONNELL, Guilhermo. Hiatos, Instituições e perspectivas Democráticas. In: A Democracia no Brasil: dilemas e perspectivas. REIS, Fabio Wanderley; O’DONNELL, Guilhermo (org). São Paulo: Vértice, 1988. 

(4)   MAIAKÓVSKIVladmir. E ENTÃO, QUE QUEREIS?.... Rússia. 1927:

Fiz ranger as folhas de jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo de cada fronteira distante
subiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.

Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,
é certo, mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?

O mar da história é agitado.
As ameaças e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio, cortando-as 
como uma quilha corta as ondas.



*Imágem ilustrativa capturada de cena do filme Procurando Nemo (Pixar- Disney, 2003)

Nenhum comentário:

Postar um comentário