A profundidade das reformas trabalhista, previdenciária e da ampliação da terceirização do trabalho, com forte impacto nos direitos e garantias consolidadas no pacto social pós-ditadura através da Constituição Federal de 1988, demanda um amplo debate público e a condução do processo por agentes com legitimidade democrática para tal.
Analisando o cenário posto, o que estamos presenciando é um processo de desmonte do Estado Social oriundo da Carta Política de 88 feito a toque de caixa, com aprovações de caráter de urgência para votação das reformas, o que escancara a clara intenção de evitar o debate público amplo e qualificado, ouvindo as partes impactadas e os especialistas nos temas objeto da "des-pactuação".
De outra banda, pergunta-se: quem são os condutores do processo? Vamos lá:
- Um vice-presidente alçado à cadeira presidencial por meio de um processo recheado de problemas formais e materiais, que, além disso, foi ridicularizado na delação do marqueteiro da campanha da chapa na qual foi eleito (João Santana), segundo o qual evitava-se a sua aparição nos programas eleitorais pois, sempre que isso ocorria, as intenções de voto diminuíam.
- Um presidente da Câmara dos Deputados produto da mais tacanha política que arrasou o Estado do Rio de Janeiro, sem esquecer que trata-se um dos nomes multi-citados na delação da Odebrechet.
- Um presidente do Senado Federal envolvido nos mais escandalosos processos de corrupção e malversação da coisa pública, representante legítimo da velha política Peemedebista comprometida com os interesses do capital.
Diante desses fatos que saltam aos olhos, fica claro o deficit de legitimidade democrática de todo o movimento, não havendo alternativa a sociedade civil organizado senão a do uso legítimo do direito de protesto, organização e pressão política popular em face da ofensiva que lhe é dirigida.
Muitos parlamentares que estão se deixando levar pelo rolo compressor do governo nessas votações podem está se despedindo da vida pública, até mesmo sem se dá conta disso, pois a ambiência institucional envolvente pode dificultar a leitura correta do que está em jogo.
No seio social é também possível se perceber rupturas e, principalmente, manifestações que expõe a incompletude do nosso processo civilizatório, representado por falas que menosprezam grupos sociais historicamente já excluídos, tais como índios, agricultores sem terra, o proletariado organizado dentre outros, servindo como vetor de catalização da tensão social e potencialização da violência.
O resultado desse fato social pode ser a maior manifestação pública com pauta reivindicativa definida desde o movimento pelas diretas, que é a greve geral do próximo dia 28 de abril. O evento merece atenção pois a partir dele podemos assistir um fenômeno que a grande maioria dos analistas políticos não cogitaria a alguns meses atrás, qual seja: a reunificação de uma base social formada por movimentos e organizações populares e por setores da classe média dispersos e afastados do debate político nos últimos anos, todos unidos por bandeiras e causas comuns.
Não é possível nem seguro prever qual será o resultado final desse processo de eletrificação da democracia participativa no Brasil, restando-nos apenas lembrar um dos ensinamentos do velho pensador florentino, príncipe da Ciência Política: "O povo conspira com quem o protege".
Isaac Luna